domingo, 23 de novembro de 2014




Mas o que tinha, afinal, naquela casa,
Que não coubesse em outras?
Um homem com mãos quentes e paredes sólidas,
Árvores de raízes antigas e água limpa
Frestas por onde suspiravam ainda, debilmente, dores já vencidas.
A respiração dele e duas cadelas
Uma vida de verdade
E o olho do meu amor que conhece desde sempre
A minha fome.

Sexta feira voltei pra casa de lotação depois do trabalho, um fim de tarde quente e abafado, as pessoas cansadas da semana de rotinas. Sentei ao lado do motorista, ele me disse: "- Esta é a melhor hora do dia, quando eu chego em casa a minha menina de dois anos traz as minhas sandálias pra eu descansar." Para segurar o pranto perguntei o nome da menina e ele disse "Celeste, ela se chama Celeste." O céu de Brasília era esplendoroso e as minhas lágrimas balsâmicas e curativas. Lembrei de como o meu pai deitava a cabeça no meu colo depois do almoço quando eu era uma menina para um cochilo antes de trabalhar. E quis agradecer ao motorista e dizer pra ele que é assim que as meninas se preparam para o amor. Desci em prantos da lotação e fui ao mercado comprar abóboras verdes e ração para os gatos. Queria contar pra todo mundo na rua: estou voltando pra casa, estou finalmente voltando pra casa. E caminhei certa e firme carregando as compras rumo ao meu destino que é te encontrar e partir para a nossa vida nova.

(Lélia Almeida)