quinta-feira, 12 de novembro de 2015


Assim estão as pessoas, por Lélia Almeida.

Somos quatro mulheres e três homens trabalhando na frente dos monitores numa sala pequena. A rotina é simples. Os homens chegam e colocam os fones nos ouvidos e comentam o jogo do dia anterior, os comentários são simples, “porra de treinador, tinha que ser demitido”; “e aquele bosta que ganha milhões e me erra aquele gol”, “e aquele frango, assim não dá.”
Todos estão com os fones e não ouvem o que dizemos.
Uma diz:
“Hoje cuspi no café dele antes dele chegar na mesa.”
“Fez pouco, disse a outra.”
“Não sei o que ele fez, mas tenho certeza que foi pouco, colega.”
“O desempenho daquele cretino, depois de uma semana sem me comer foi nota 5, ficou de recuperação esta noite.”
“Penso tanto numa vingança e não me vem nada decente à cabeça, uma vingança que me alivie os cornos, entendeu.”
“Compra líquido para os freios e joga na lataria do carro que a pintura faz assim ó wijepcaslnasnlasksi.”
            Todas rimos. Ela acrescenta:
“Faz três vezes, ele conserta e você repete e fica super solidária com ele e se ofereça para ir junto com ele na polícia fazer um BO contra tamanho vandalismo, com cara de Cinderela.”
            É o momento da queixa matinal, umas tem olheiras pela noite mal dormida por conta da nenê gripada, a outra vai ao banheiro fazer o risquinho preto no olho, que se atrasou tanto que saiu com “cara de ontem”, como esclarece. Depois, quase sempre, espiamos o horóscopo do dia, cheias de esperança.
Na metade da manhã começamos a interagir. Os homens, já sem os fones, e num mau humor canino por conta do timão decaindo, não tem noção do que falamos, assim como nós nem imaginamos o nome do técnico ou do maldito goleiro.
Assim são os homens e assim são as mulheres, a vida é mais do que simples.

Mas eu gosto mesmo é das mulheres. Porque elas são doidas varridas, loucas de atar, não enfartam porque se queixam e tem o apoio condicional das outras mulheres, sempre. Eu gosto das mulheres más e cansadas, e das insatisfeitas, eu gosto das mulheres de verdade, que tomam um café quente e dividem o biscoito de chocolate que é sempre amaldiçoado e aceito vorazmente como uma hóstia divina contra a dureza da vida.

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