sábado, 19 de maio de 2007

Uma segunda chance é um luxo:

Tem duas datas que me enchem de alegria e esperança todos os anos. Da mesma maneira. O ano novo e o meu aniversário.

Não sou das que não gosta de Natal, mas desde que virei mamãe-noel, o natal tem demandas que me ocupam de forma pragmática, como por exemplo, fazer caber os sonhos de consumo do meu rico filho no orçamento familiar e coisas do tipo. Mas gosto também do natal, gosto de como ele gosta, do jeito e da alegria dele, eu gosto.

Mas o ano novo não, sou fanática, roupa de festa, calcinha amarela, aqueles fogos de artifício que me emocionam sobremaneira e eu sinto uma esperança enorme com o novo ciclo que vai começar.

Tenho vontade de ser boa, fazer tudo direitinho, meu coração fica cheio das melhores intenções e aquela vontade enorme de fazer dar certo as coisas todas que eu sonho meio parecidas a cada começo e final de ciclo, este ano eu vou fazer ginástica, manter minha correspondência em dia, enfim, todas as bobagens que decidimos ser inadiáveis e que ficam sempre pra trás.

Meu coração palpita da mesma maneira como quando eu era menina, e gostava de pensar que é maravilhoso que a cada ano a gente tenha uma oportunidade de recomeçar, uma segunda chance, de tentar fazer melhor, maior, de um jeito diferente.

E o dia do meu aniversário, que eu espero com a mesma emoção infantil. Gosto de esperar por tudo, o carinho dos amigos, as comilanças, os presentes, serve qualquer lembrancinha, mas me sinto muito especial, a homenageada, e um sentimento de que os amigos nos acompanham na jornada e que tá dando certo, a vida, caminhando, tá tudo certo.

Fiz quarenta e um anos a semana passada e me sinto como a personagem do Tomates verdes fritos, vivido magistralmente pela deliciosa Kathy Bates quando ela diz, em plena crise de meia-idade, que ela se sente muito velha pra ser moça e muito moça pra ser velha.

Acho que é esse o grande encanto dos quarenta, que se para alguns é uma benção, para outros é um dilema. Não pra mim, que aprendi por dolorosas vias que a vida é preciosa demais, e que é hoje que tem que ser bom, bom como nunca mais. Mas nem sempre dá certo esta disposição pra bem viver, confesso, quase sempre dá errado, o cansaço, o trabalho, nossos sonhos perdidos, tudo parece conspirar contra, porque a vida sabe ser dura, meu deus, se sabe.

Mas no dia do meu aniversário eu penso que tá tudo bem, mais um ano, um ano da minha vida. E posso relativizar tudo, e sei, que na totalidade do que é a minha existência, alguns momentos são isso e nada mais, os bons e os difíceis, são bons e difíceis e não tem choro.

No dia do meu aniversário parece que tenho uma compreensão profunda da história dos meus dias, que é a história simples da minha vida, da minha biografia. Cheia de erros e atrapalhações, de sonhos que eu não vou mais realizar, de sonhos que eu não vou mais sonhar, a história do meu corpo que não é mais jovem e dos amores que não tive, das viagens que não farei e dos amigos perdidos que ficaram pra trás, alguns pra sempre.

Olho pra mim de forma breve, atenta, como num estranho espelho interior e tenho uma visão lúcida e clara de mim mesma. É um olhar quase sereno. É uma visão rápida, como um flash, e depois volto a ser aquela que pensa que ainda pode, que ainda deve, que ainda quem sabe, que pena que não foi daquele jeito, etc., cumprindo com a ansiedade de atravessar os dias e as noites e de querer realizar os projetos de vida que nem sempre correspondem aos sonhos que tivemos um dia.

É assim este dia pra mim, um por ano, quando penso que tá tudo certo, que a vida é uma bobagem de tão simples e que eu quero ser como a minha tia Magdala que tem 95 anos e outro dia me disse muito surpresa, quase incrédula, "e não é que estou ficando velha!".

É o que eu mais gosto do meu aniversário, de pensar que tem uma segunda chance, de novo, uma vez mais, e que esta segunda chance não é pra todos, que poder nascer de novo a cada ano não é pra qualquer um.

Uma segunda chance a cada ano, ao longo de uma vida, é um luxo.

E eu agradeço.

Lélia Almeida

Nenhum comentário: